Essa é mais uma daquelas cartas que escrevo para você e sei que não vou enviar. Na verdade, nem sei se escrevo mesmo para você ou se faço isso na esperança vã de que as lembranças suas tragam de volta o meu sorriso, a alegria aos meus olhos… Dizem que amor não se mendiga, amor se sente e é uma pena que dificilmente duas pessoas o sintam na mesma intensidade. Deus, como eu te amei. Como eu te amo. Mas acabou pra você e eu fiquei aqui olhando para as paredes e tentando entender onde estavam os sinais, se você havia me demonstrado em algum momento que o seu sentimento por mim estava se esvaindo como areia por entre os dedos.
Você se foi e eu fiquei parada nas lembranças, incapacitada nas memórias das coisas que fazíamos a dois e que agora não sei mais fazer sozinha. Não ouço aquele disco da Elis há um tempão, porque sentar na varanda na sexta à noite com um bom vinho nas mãos tendo Elis de fundo musical era coisa nossa, não minha sozinha. Aliás, quebrei todas as taças. Não preciso mais de duas taças para beber com você e sozinha posso beber direito da garrafa. Posso imaginar a sua cara se lesse isso, o ar de desaprovação me chamando de garota deprimente e talvez eu seja mesmo, mas é que as lembranças arranham e machucam tanto quanto os cacos de vidro. Elas rasgam por dentro e eu cansei dessa sensação. Cansei não, eu simplesmente não aguento mais essa sensação. Cada um lida com as lembranças como pode e você sempre me acusou de ser passional demais. Talvez eu seja mesmo.
Eu queria poder voltar no tempo com você. Direto para aquela época em que ainda éramos felizes e tudo estava no lugar. Ainda tínhamos duas taças de vinho no armário. Ainda saíamos com os amigos, mas você logo insistia para irmos embora para me ter só para você, alojada em seus braços, encaixada em seu peito. Mais do que tudo, uma época em que você ainda olhava e voltava para mim todos os dias. Uma época em que eu ainda sorria e os meus olhos eram alegres.
Mas o tempo não volta e enquanto isso eu continuo aqui tentando arrancar à força as lembranças suas, e minhas, que você deixou em mim.