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Eu só quero que você esteja em paz

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Sonhei com você noite passada. Nem percebi que estava chorando, mas acordei com o travesseiro molhado e o coração pesado e doído. Você estava lá, caído na calçada, já sem vida, mas seu sorriso continuava o mesmo. Sereno, como se estivesse em paz e seguro do que acabara de fazer. Exatamente como naquela mesma noite, meses atrás. Noite que eu queria esquecer para sempre.

Eu guardei suas fotos na minha caixa de lembranças. É que doía olhar para elas. Ver você tão feliz naqueles instantes congelados em cada uma das fotos, me fazia ficar tentando encontrar qualquer sinal de quando foi que a felicidade lhe escapou. Quando foi que o sorriso parou de chegar aos olhos. Quando foi que eu parei de olhar, de verdade, pra você.

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Você tentou me pedir socorro? Me mandou algum sinal do que estava prestes a fazer? Seus silêncios gritavam por mim? Fico repassando cada uma das nossas conversas, principalmente a última. Como eu não percebi que tinha algo ali? Que aquela pessoa ao telefone não era o seu verdadeiro você? Que você precisava de mim como nunca precisara antes?

Você se foi e só me resta a sensação de que eu podia ter feito mais por você. Que eu podia ter demonstrado mais o tamanho do meu amor.

Você se foi, e eu espero que agora você esteja em paz.

Pelo menos você.

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Voo para a liberdade

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Quando criança o óculos era a primeira coisa que as pessoas viam ao olhar para ela. Não demorou para que as outras crianças passassem por ela rindo, apontando e a chamando de “quatro-olho”.

Na adolescência, além dos malditos óculos, ela era desengonçada, magra demais, tinhas as pernas finas. Ganhara um novo apelido, Olívia Palito de óculos. Ouvia as amigas contando sobre o primeiro beijo, os amassos com os garotos e apenas sonhava que era uma garota “normal”, com direito a tudo isso também. Tentou usar lentes de contato, mas descobriu ser alérgica a elas.

Ao se ver livre da escola acreditou que na faculdade tudo seria diferente, mas desde o primeiro dia ficou conhecida como A Nerd, mesmo antes de abrir a boca para dizer qualquer coisa.

Pelo jeito as pessoas nunca estariam dispostas a ver o que havia por trás daquelas lentes e daquele jeito desengonçado de ser. Cansada, naquela tarde não foi direto para o seu apartamento ao chegar em casa, mas apertou o botão que indicava o terraço do prédio. Ao se equilibrar no parapeito viu as pessoas pequenininhas lá embaixo. Dali ela não saberia dizer quem usava óculos, quem era magro demais, gordo demais, manco, todos pareciam iguais. Seu primeiro ato foi se livrar dos óculos e nem piscou enquanto o objeto caía os 20 andares até se despedaçar na calçada, lá embaixo. Depois, foi a sua vez de abrir os braços e se jogar, sem pensar em nada nem ninguém. Ela só conseguia pensar na liberdade.

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Manu

inquietação

Nem sabia mais a quanto tempo aquela inquietação estava ali. Ela apenas sentia, e sentia que a sensação crescia, como o ser que descobrira crescer dentro dela. Um ser não planejado, um ser sobre o qual nem mesmo conseguia falar a respeito. Um ser que era o seu segredo, assim como aquela inquietação.

Pintara o cabelo, trocara os móveis de lugar, mas nada fora capaz de dar jeito naquilo que a corroía por dentro, naquela sensação de saber que algo estava errado, muito errado com a sua vida. Continuava sorrindo quando as pessoas lhe diziam o quanto ela era sortuda pelo noivo perfeito e apaixonado que tinha, pela casa tão lindamente decorada em tons de branco e lilás, pela médica sensacional que se tornaria em poucos meses, mas o sorriso não era mais vivo como antes. Aliás, nada mais parecia ter vida ali e ela se sentia apenas como um espectro, já sem vida, naquele imenso quadro sem cor ou qualquer emoção para lhe dizer que ainda havia esperança.

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Não, ela sabia que não havia mais qualquer esperança e foi por isso mesmo que tomou sua decisão assim que abriu a gaveta da sala e viu o objeto pontiagudo. Fora um presente dele e ela sabia que provavelmente ele nunca se recuperaria daquilo, mas ele precisaria entender que ela não tivera escolha. Ela precisava voltar a sentir paz, era só isso que ela buscava.

E a última coisa de que se deu conta foi de que ela não estava mais lá. A inquietude finalmente sumira. E, em paz, sorriu.

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